Monday, November 5, 2007

Das coisas que ninguém sabe

Saiu do banheiro e foi correndo para o quarto. Estava sempre atrasada. Seu marido tentava achar causas para um motivo que não a incomodava mais: aprendeu a viver assim. Desconversava quando ele criava uma nova teoria. Seria culpa da cafeteira que demora mais do que a embalagem garante? Não sabia e sabia. Não queria contar que o motivo dessa falta de sincronia com o mundo era ele. Preparar seu desjejum, pendurar a toalha que ele deixava em cima da cama e ir atrás dele lembrando de pequenas particularidades necessárias para um bom decorrer do seu dia.
Isso nunca a incomodou: a única sincronia necessária para a sua felicidade era perfeita e sempre pontual.

Thursday, October 18, 2007

O feio




Já reparou como ficamos feio quando choramos, rimos ou gozamos?
Nos retorcemos, ficamos suados e nossos rostos e corpos adquirem um aspecto estranho como se a nossa natureza bruta finalmente emergisse.
O ser humano realmente não nasceu apto à felicidade nata.
A ser belo, controlado, cheiroso.

Obrigada por aceitar nossas bestas, amor.
Continuemos horrorosos.

I don't love you, I need you

..porque é nesse descontrole que me acho.
Começando com pontos, terminando com vírgulas.
Não sei mais escrever frases completas, sei alinhar pequenos pensamentos.
São milhões pulando, voando, batendo no meu crânio e, ás vezes, consigo pegar o pedaço de uma borboleta de palavras para transcrever.
Tentativa vã de me esvaziar, dar espaço para o ato do sangue fluir e adquirir oxigênio.
Ou seja, isso não é exercício de ego ou capricho. É fisiologia. É necessidade.

Monday, October 8, 2007

O lixo e a cidade

O aleijado trava uma batalha apoteótica contra sua deficiência e o coletivo enquanto assisto a cena sentada comendo biscoitos.
O Rio de Janeiro continua lindo mesmo com o mar de papéis e detritos cobrindo todas as ruas que piso, desafiando o tráfico e a violência.
Cadê a flor drummondiana?
Só vejo o concreto.

Tuesday, October 2, 2007

Para gostar de você

# Diálogos


- Eu não acredito nisso.
- Em nós?
- Não, esse é o problema: só acredito em nós. Como se fôssemos essa única força que mantesse o Universo em equilíbrio. Isso porque sou uma criança ignorante, claro. Desconheço outros universos. Conheço o meu, e esse é regido por você e eu. Acho que isso me basta, não procuro explicações na política, religião ou na psicanálise. Ou talvez porque, na verdade, já tenho isso tudo internalizado. Como a idéia da morte.
Sabe, as pessoas temem a morte - obviamente, mas conseguem viver mesmo sabendo que isso vai acontecer. Porque essa certeza está lá, no fundo mais fundo da nossa mente, desde o momento em que nascemos. Se realmente tivéssemos um momento onde percebessemos que a morte é algo real, a nossa vida pararia ali. Após aquele terrível momento.

Graça

Tenho uma parte quase doce.
Esse instinto maternal que não sei muito bem lidar e acabo jogando para cima de qualquer homem que me envolvo.
Sufocando, engolindo.

E essa parte violenta.
Masculinizada, de muitos gritos e raiva. Essa eu mostro para todos. Gosto de espinhos mais do que de pétalas.
Sufocando, engolindo, destruindo.

Sometimes I think that I'm overwhelming.

Mezzanine

Hoje em dia todo mundo é escritor.
Todo mundo escreve sobre suas dores e feridas. Todos sofrem e tem neuroses.
Está aí, do lado de fora: o tiro, a doença, o prozac, a bala e a caneta em punhos.
Essa comunhão de coisas sujas e belas criando linhas tortas para cegos lerem.